Uma organização do tamanho do Pantanal


15 abril 2003

Quem nunca ouviu falar do Pantanal Mato-grossense? Se você nunca ouviu, é porque esteve ausente em algumas aulas de geografia durante a sua carreira estudantil. Ah, você é estrangeiro? Também não tem desculpa! Afinal, a própria Unesco reconheceu o Pantanal como uma das mais exuberantes e diversificadas reservas naturais do planeta, integrando-o ao acervo dos patrimônios da humanidade. Está se sentindo deslocado? Está bem. Como pregamos a democratização de informações, vamos recordar algumas das principais informações relativas ao santuário ecológico em questão. Estas informações, além de agregar conhecimento ao caro leitor, são fundamentais para o entendimento da importância do trabalho realizado desde 1988 pela OSCIP (organização da sociedade civil de interesse público) Ecotrópica, uma entidade ambientalista sem fins lucrativos.

O Pantanal Mato-grossense é a maior planície alagada do continente americano; uma depressão sazonalmente inundada, totalmente contida na bacia de drenagem do Alto Paraguai, compreendendo 133.465 km2. Localizado no centro-oeste brasileiro, o Pantanal alcança partes dos estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, como também da Bolívia e do Paraguai. Apresenta a maior concentração de fauna do Novo Mundo, sendo comparável às áreas de maior densidade animal da África. Já foram catalogadas mais de 650 espécies diferentes de aves, 262 espécies de peixes, 1.100 espécies de borboletas, 80 espécies de mamíferos e 50 de répteis. Com respeito à flora, até o momento foram identificadas 1.700 espécies de plantas. Por toda esta riqueza, é considerado pelo Banco Mundial como área vulnerável, de importância mundial e prioridade máxima para conservação.

Além da enorme quantidade de animais silvestres, a principal característica da região é sua cheia periódica. Durante os meses de outubro a abril, as chuvas aumentam o volume das águas dos rios que, por causa da pouca declividade do terreno, extravasam seus leitos e inundam a planície pantaneira. Nesta época, muitos animais buscam refúgio nas terras não inundadas. Peixes se reproduzem e muitas plantas aquáticas entram em floração. A principal atividade econômica desenvolvida na planície pantaneira é a criação de gado bovino, que foi introduzida na região no final do século XIX. O rebanho bovino é estimado em 3 milhões de cabeças. A pesca também é uma atividade bastante desenvolvida na região. Mas a falta de controle sobre as atividades econômicas desenvolvidas no Pantanal e em suas áreas de entorno são uma ameaça constante ao equilíbrio do ecossistema. Dentre as atividades que podem trazer problemas ambientais estão: o desenvolvimento acelerado da agricultura, a mineração, o aumento do lixo urbano, a drenagem artificial, a produção agropecuária e projetos de navegação.

Algumas atividades representam ameaça direta à vida selvagem, como: a pesca predatória, a caça ilegal e o crescimento desordenado do turismo. A preocupação se dá em função da quantidade insuficiente de iniciativas que objetivem reverter o quadro evolutivo de degradação. Mas como esta coluna tem como propósito apresentar gente que está com o “pé na estrada”, vamos conhecer a Ecotrópica e seus empreendimentos sociais.
Fundada há cerca de 14 anos, esta organização não-governamental ambientalista tem como missão contribuir para a conservação dos recursos naturais e a manutenção da qualidade de vida nos ecossistemas tropicais. Instituída em Cuiabá, capital do Mato Grosso, a Ecotrópica possui o título de Utilidade Pública Federal, através da Lei nº 7006. Nos últimos anos, tem o seu foco na proteção do Pantanal. Este foco existe em função da compreensão da importância e da vulnerabilidade deste ecossistema. Em meados dos anos 90, a organização delineou uma de suas ações mais importantes: a proteção da biodiversidade in situ no entorno do Parque Nacional do Pantanal Mato-grossense (conheça mais no box nº 1).

Estava claro que a melhor forma de executar as suas ações seria através da aquisição de propriedades, nas quais as iniciativas seriam rigorosamente desenvolvidas, preservando aquele espaço específico e dando provas incontestes da viabilidade do desenvolvimento sustentável. Para tanto, era indispensável a captação de recursos. Pautando seu trabalho de captação de recursos no profissionalismo e na transparência, a Ecotrópica conseguiu, em 1995, catalisar esforços e levantar fundos em parceria com a The Nature Conservancy. Esta verba foi utilizada para adquirir as fazendas Acurizal, Penha e Dorochê, transformando-as, em 1997, em Reservas Particulares do Patrimônio Natural – RPPN (conheça mais no box nº 2). Estas fazendas somam, juntas, 55 mil hectares, representando a maior área de preservação permanente de propriedade de uma organização não-governamental brasileira. Para se ter uma idéia do tamanho destas áreas de preservação, basta dizer que equivalem a aproximadamente 72 mil campos de futebol iguais ao Maracanã. Elas contribuem para aumentar em quase 44% as áreas protegidas no Pantanal Mato-grossense. Estas áreas, associadas ao Parque Nacional, passaram a constituir um dos mais relevantes complexos de áreas úmidas protegidas do planeta. Espaço onde as espécies animais, incluindo-se aí algumas ameaçadas de extinção, têm pouso seguro para alimentação e abrigo.

Um outro desafio no que diz respeito à captação de recursos está relacionado ao pagamento e manutenção dos meios de transporte necessários para o deslocamento até as fazendas. Como parte das conquistas da organização, está sendo adquirida, com muita dificuldade (através da venda de cotas aos sócios-contribuintes), uma aeronave pequena. Nada de luxo, apenas necessidade real de transporte em uma região bastante difícil de transitar, em função das distâncias e condições precárias das estradas.
Certamente ficaram claros os resultados que uma gestão séria, com uma equipe enxuta e multidisciplinar, pode alcançar. Mas afinal, como são conquistados e gerenciados os recursos e processos necessários para implementar, manter e ampliar as iniciativas ambientais da Ecotrópica? Quem imagina que o trabalho é simples está completamente equivocado. Assim como milhares de outras organizações sociais, a Ecotrópica enfrenta desafios diários. Para driblá-los, busca de forma consciente, e portanto constante, parcerias institucionais com empresas e sócios-contribuintes, a fim de que a sua estrutura de conservação ambiental possa ser mantida e melhorada. Conhecendo a organização, pode-se perceber a noção de que os mesmos recursos que fazem o sucesso de uma empresa – pessoal comprometido, tecnologia de ponta, produtos de qualidade e marketing estratégico – podem ser igualmente efetivos para proteger a saúde de ecossistemas em perigo e melhorar a qualidade de vida das pessoas que lá vivem. E para colocar em prática este correto conceito, foi criado um programa de parceria que busca aliar conhecimentos empresarias ao caráter empreendedor de uma organização do Terceiro Setor, utilizando estratégias comerciais planejadas para gerar atividades conservacionistas de sucesso.

Não há como negar que as empresas, potenciais apoiadoras das iniciativas sociais, recebem continuamente inúmeros convites para apoiar projetos. A Ecotrópica, buscando diferenciar a sua proposta e alcançar os necessários recursos, apresenta claramente às empresas e fundos internacionais, os benefícios de uma parceria. Dentre elas, destacam-se: relações públicas positivas e oportunidades de comunicação; associação de marca com uma organização com credibilidade em conservação ambiental; convites para a participação de eventos organizados pela Ecotrópica; convites para a visita de membros da diretoria às RPPNs da Ecotrópica e divulgação do nome do parceiro em todas as publicações da Ecotrópica. Observem que existe um esforço de tornar transparente a parceria, convidando o apoiador a estar presente em diversos momentos, fazendo parte efetiva do processo de transformação. Esta forma de abordar as empresas mostrou ótimos resultados no ano de 2002, quando a organização conseguiu o apoio de duas empresas, Unilever Brasil e Refrigerantes Marajá. É sempre importante ressaltar a necessidade de tornar público e transparente o balanço social da organização. E para tranqüilidade dos apoiadores, a Ecotrópica o faz anualmente em seu folder de apresentação.
E a fórmula utilizada comprova sua eficiência inclusive com o reconhecimento nacional e internacional, através do recebimento de prêmios como o Prêmio Henry Ford de Conservação Ambiental, Prêmio UNESCO, Prêmio Ambiental Von Martius, entre outros. Pode parecer um contra-senso, mas muitas vezes o reconhecimento e o apoio vêm de fora do país, mesmo sendo o Pantanal um patrimônio brasileiro. E por acreditar na importância de preservar este ecossistema riquíssimo é que a Ecotrópica não se intimida com as distâncias, tampouco com as dificuldades da gestão de uma organização social. Atualmente pode-se ter uma idéia da relevância destas iniciativas de conservação, mas quem realmente agradecerá o empenho dos batalhadores de hoje serão as próximas gerações, que olharão para trás e reconhecerão o valor daqueles que lutaram contra a maré e defenderam as nossas riquezas naturais. Que assim seja.

 
Fonte dos dados estatísticos: Embrapa

Informações nº 1 – Parque Nacional do Pantanal Mato-grossense
O Parque Nacional do Pantanal foi criado em 1981, mas somente designado em 1993 como área de preservação. Está localizado no município de Poconé, extremo sudeste do Mato-Grosso, com uma área de 135.000 ha. É a maior planície alagada do planeta e a terceira maior reserva ambiental do mundo. Possui uma imensa importância ecológica por abrigar um dos mais ricos ecossistemas com florestas estacionais periodicamente alagadas. Foi reconhecida como Reserva da Biosfera Mundial pela Organização das Nações Unidas Para a Educação Ciência e Cultura (Unesco). Este título permitirá mais apoio do governo e da sociedade para a conservação das riquezas e a implantação de um desenvolvimento sustentável na região.

Informações  nº 2  – Reservas Particulares do Patrimônio Natural – RPPN
O Programa de Reservas Particulares do Patrimônio Natural – RPPN, do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – IBAMA, visa dar oportunidade a que proprietários de imóveis onde existam locais de relevante beleza cênica e/ou apresentem condições naturais primitivas ou recuperadas e que, assim, sirvam à preservação do ciclo biológico de espécies nativas, sejam reconhecidos pelo poder público, o zelo e alta consciência ambientalista demonstrados na preservação dessas áreas. O reconhecimento e o registro dessas áreas como Reservas Particulares do Patrimônio Natural não acarretam aos seus proprietários prejuízo do direito de propriedade, mas, pelo contrário, asseguram-lhes o mesmo apoio e proteção dispensados pelas autoridades públicas às unidades de preservação permanente.

Dados da organização:

Número de voluntários: 25
Área de preservação mantida pela organização: 55 mil hectares
Meio de transporte: avião modelo Cessna Skyline usado em boas condições e uma camionete


Contato:

Site: http://www.ecotropica.org.br
E-mail: ecotropica@ecotropica.org.br
Endereço: Rua 3, nº 391 Boa Esperança – Cuiabá, MT-Brasil
Telefone: (0xx65) 627-6619