“O SUS está vivinho da Silva. É o sonho de consumo em muitos países”

Larissa Costa Mendes
21 novembro 2019

Em entrevista para o blog Viva Bem, de Cristiane Segatto, o médico italiano Renato Tasca defendeu o SUS – Sistema Único de Saúde. Confira alguns apontamentos dele:

Renato Tasca, coordenador de sistemas e serviços de saúde da Organização Pan-Americana da Saúde.

VivaBem: Por que o sr. diz que o SUS está vivinho da Silva?

Renato Tasca: Existe certa opinião negativa em relação ao SUS e à administração pública em geral. Pensam que o Estado tira o dinheiro dos cidadãos, por meio de impostos, como se isso fosse uma função predatória. Acham que funcionários públicos são parasitas que aquecem cadeiras e se envolvem em corrupção. Uma das formas de destruir esse mito é dar visibilidade aos heróis silenciosos que trabalham, cotidianamente, em situações muito complicadas, com poucos recursos, em contextos difíceis e com chefes que não ajudam. E, mesmo assim, realizam coisas muito importantes no SUS.

VivaBem: Qual é o papel do setor privado na gestão do SUS?

Renato Tasca: O setor privado, quando é chamado segundo uma lógica saudável, pode contribuir. O SUS já nasceu com o privado em seu DNA, mas acho que deveríamos procurar uma relação diferente entre o público e o privado. Hoje parece que eles são dois boxeadores, um tentando acertar o outro primeiro. É preciso achar outros caminhos para que seja, realmente, uma relação ganha- ganha. Não pode ser como é hoje, em que ganha um ou ganha o outro, mas a população pode perder. O setor privado pode dar ideias e, de alguma forma, contribuir para a gestão. A gestão do SUS é participativa. Todos os agentes sociais (cidadãos, empresas etc) estão envolvidos. Mas o fato de o setor participar diretamente na execução não quer dizer que ele tenha que participar do planejamento do sistema. Até porque há conflitos de interesse aí. A principal crítica feita às agências reguladoras é que, quando os interesses privados entram nas agências, começa a dar problema. O Estado tem que cuidar dos interesses da população. O setor privado tem que pensar na sua responsabilidade social para com o país, mas fundamentalmente, ele pensa no lucro.

VivaBem: De que forma o SUS ameniza a desigualdade social?

Renato Tasca: O SUS é o maior programa social do Brasil. Imagine os pobres, as pessoas sem emprego, as mais afetadas pela crise… Imagine se elas tivessem que usar o pouco dinheiro que têm para vacinar os filhos, fazer pré-natal e ir ao médico – tudo no sistema privado. Seria uma coisa terrível. Na maioria dos países e, sobretudo, naqueles do tamanho do Brasil (China e Índia), não existe nada como o SUS. Se o pobre quiser uma cura, tem que pagar. Ter um SUS é o grande sonho de consumo dos cidadãos de muitos países. Nos Estados Unidos, o número de famílias que se ferram, que perdem tudo por causa de contas de hospital é enorme. O avô teve um AVC, foi para a UTI, morreu, e a família recebe uma conta de US$ 200 mil ou mais. Tem que vender a casa, o carro, tudo o que tiver. No SUS, isso não acontece. Os brasileiros não percebem, mas o SUS tem uma relevância enorme no mundo. O Brasil é o único país com mais de 100 milhões de habitantes com um sistema universal que funciona. O SUS foi criado como um programa social que vai muito além da atenção médica. É uma pena que hoje todo o esforço na criação e desenvolvimento do sistema não seja reconhecido. Hoje as pessoas acreditam mais em fake news do que em um artigo científico publicado no The Lancet. Não podemos desistir. É preciso acabar com a narrativa de que o SUS não funciona.

Leia a entrevista completa no blog Viva Bem.