Pesquisa revela que 35 milhões de pessoas estão ligadas ao voluntariado no Brasil


3 julho 2013

Deniele Simões

Deniele.jornal@editorasantuario.com.br

 

Uma pesquisa promovida pela Rede Brasil Voluntário e o Ibope Inteligência aponta que cerca de 35 milhões de pessoas fazem ou já fizeram algum tipo de trabalho voluntário no país.

 

Desse total, 11% exercem alguma atividade voluntária no momento. Isso significa que há pelo menos 20 milhões de voluntários atuando em diversas frentes no país.

 

O levantamento foi encomendado pela Rede Brasil Voluntário com o objetivo de analisar o atual cenário do voluntariado, após 10 anos da mobilização pelo Ano Internacional do Voluntário, celebrado em 2001.

 

Os dados apontam também que 67% dos entrevistados praticam o voluntariado por quererem ser solidários e ajudar o próximo. Outros 32% aderem para “fazer a diferença e melhorar o mundo” e os 32% restantes fazem isso por motivações religiosas.

 

Segundo a coordenadora do Centro de Voluntariado de São Paulo, Silvia Maria Louzã Naccache, tanto no Brasil quanto no mundo, as ações voluntárias são entendidas como exercício da cidadania. “São cidadãos preocupados com as necessidades de sua comunidade e que compreendem que é preciso haver a união entre governo, empresas e sociedade civil para a solução dos problemas sociais”, aponta.

 

Silvia destaca ainda que o voluntariado é uma união de esforços de pessoas que enxergam a vida de modo diferente e que se propõem a minimizar as dificuldades do outro.

 

A prática segue a lógica de que todos devem atuar juntos para a construção de uma sociedade mais justa e solidária, visando um mundo melhor não só hoje como para as futuras gerações.

 

Por que ser voluntário é bom

 

A maioria dos entrevistados (77%) declarou estar totalmente satisfeita com o serviço voluntário que realiza. Além disso, 87% disseram que estão totalmente motivados em continuar exercendo esse tipo de trabalho. Isso quer dizer que o trabalho voluntário faz muito bem para quem pratica.

 

De acordo com a psicóloga clínica Keli Rodrigues, o voluntariado ajuda o praticante a conhecer-se melhor e a resignar-se. Isso porque o contato com a dor do outro pode minimizar o ponto de vista sobre as próprias dores e ajudá-lo a aprender a valorizar e respeitar suas conquistas e amizades.

 

Silvia Naccache destaca que qualquer pessoa pode ser tornar um voluntário, mas é preciso refletir muito antes de iniciar o trabalho. Por se tratar de uma escolha individual, é importante que o candidato tenha em mente o que quer fazer, o que tem de melhor para oferecer e como o seu trabalho pode fazer a diferença na vida das pessoas que for ajudar.

 

A psicóloga Keli reforça também que a pessoa disposta a assumir o voluntariado deve ser empática com a dor do outro, sem esperar qualquer tipo de recompensa. “Assim a doação será muito mais inteira”, justifica.

 

O voluntário também precisa entender que esse tipo de trabalho é muito sério e não pode ser abandonado a bel prazer, sem nenhuma comunicação prévia. Outra questão fundamental é exercer as atividades de maneira ética e responsável.

 

Também é fundamental estar de coração aberto para exercer a função. Depois, a medida em que há comprometimento e envolvimento, o trabalho passa a ser algo mais emocional do que racional. “E aí, sim, esse desejo puramente de auxiliar torna-se pleno”, completa Keli.

 

Felipe Mello, um dos fundadores da Ong Canto Cidadão, lembra que o voluntariado incide diretamente no comportamento humano, trazendo inúmeros benefícios. Um deles é o voluntário sair da zona de conforto para criar soluções, ainda que pequenas. “Isso gera um acréscimo na crença da possibilidade de a pessoa criar no mundo, e assim ela se fortalece porque deixa de ser espectadora e passa a ser protagonista”, revela.

 

Outro benefício é a vontade de se interessar para tornar-se interessante, já que o princípio dos bons relacionamentos está relacionado à empatia, que é a capacidade de um se colocar no lugar do outro. Mello cita ainda a melhora nos processos de criatividade, comunicação oral e corporal e, assim como na capacidade de improvisar.

 

Voluntariado e mercado de trabalho

 

Silvia Naccache destaca que o crescimento e amadurecimento de programas de responsabilidade sócio-ambiental nas empresas fez surgir a oportunidade de mobilização para que os funcionários possam exercer a cidadania e a solidariedade através do voluntariado.

 

De acordo com Felipe Mello, já existem empresas que, em processos seletivos, observam com atenção o fato de o candidato ter experiências como voluntário. “Creio que o motivo tenha uma natureza social, ou seja, a empresa interessada em pessoas que pensam coletivamente”, opina.

 

Outro aspecto colocado por ele e que, talvez seja o principal, é que o voluntariado contribui para o desenvolvimento de competências muito conectadas com a realidade das empresas, como o trabalho em equipe, por exemplo.

 

Silvia complementa lembrando que o desenvolvimento da cultura do voluntariado pode ajudar na construção de uma sociedade com um sistema de valores mais humanos, entre eles a solidariedade, a compaixão, a participação e principalmente a formação de líderes capazes de construir famílias mais felizes, empresas mais saudáveis e comunidades mais solidárias.

 

Voluntariado é um dos pilares da Igreja Católica

 

O trabalho voluntário costuma unir muitas pessoas em favor do próximo dentro da Igreja Católica, seja na liturgia, nas ações pastorais ou mesmo em atividades que ultrapassam o limite da religiosidade.

 

O Santúario Nacional de Aparecida é um exemplo de instituição religiosa onde esse tipo de ação é levada muito a sério. Atualmente, 536 pessoas atuam como voluntários nos mais diversos setores, como coral, leitura, ministério eucarístico, acólitos e acolhida.

 

Um dos setores mais atuantes é o de ministros da eucaristia, que conta com 285 voluntários auxiliando religiosos na distribuição das hóstias consagradas e outros rituais durante as missas e celebrações.

 

Outro setor de grande relevância é o da Acolhida, em que 39 voluntários auxiliam os visitantes com informações.

 

De acordo com o padre Antônio Augusto Frasson, um dos responsáveis pelo setor, a equipe foi formada há cerca de 15 anos para cumprir o princípio básico de que “acolher bem também é evangelizar”.

 

“São pessoas que se comprometem voluntariamente a acolher os romeiros nos pontos estratégicos do Santuário, prestando informações, esclarecimentos e respondendo perguntas que os visitantes fazem”, explica o sacerdote.

 

A equipe é formada por pessoas da região de Aparecida, Guaratinguetá, Potim, Roseira e outros municípios do médio Vale do Paraíba.

 

O representante comercial Airton Grilo, de 53 anos, doa seu tempo livre para ajudar tanto o setor de liturgia, do qual faz parte há 27 anos, como a equipe de acolhida.

 

Na opinião dele, o grande desafio é estar sempre disposto a atender bem as pessoas que procuram ajuda e conhecer bem o aquelas pessoas que procuram ajuda e conhecer bem o Santuário para poder informar bem o romeiro.

 

O representante comercial enxerga no voluntariado um ato de amor e gratuidade de servir a Deus na pessoa dos irmãos. “É uma maneira de se cultivar a bondade e a humildade das pessoas, porque toda gratidão retorna para você que vai cada vez mais estar disposto a ajudar o seu semelhante”, completa.

 

Segundo padre Frasson, o trabalho voluntário é fundamental para que o peregrino sinta-se bem e acolhido no Santuário, independentemente da área de atuação e da quantidade de horas doadas ao próximo.

 

“Quem vem de longe ou de perto sente-se feliz aqui e para o voluntário também é uma satisfação por ajudar o romeiro”, destaca.

 

Quem quiser participar como voluntário deve procurar a Secretaria de Pastoral, no Santuário Nacional. Antes de começar a trabalhar, o candidato passa por encontros de formação e capacitação.

 

Área da saúde desperta cuidado pelo próximo

 

O voluntariado na área da saúde é talvez um dos trabalhos mais desafiadores, porque expõe as mazelas de quem necessita de atendimento à sensibilidade de quem se oferece para ajudar.

 

A Ong Canto Cidadão, em São Paulo (SP), mantém o projeto Doutores Cidadãos, que oferece voluntários vestidos de palhaços para atendimento em hospitais, casas de saúde e asilos.

 

Felipe Mello diz que não existe um perfil único de voluntários, já que para participar, não se exige formação na área artística ou saúde. “O interessado participa de algumas etapas do treinamento, sendo que ao final é designado para compor um grupo que visitará uma determinada unidade de saúde dentro de uma periodicidade combinada entre as partes”, detalha.

 

Ainda na fase de treinamento, os voluntários têm acesso a uma cartilha chamada “Kit de primeiros socorros”, por meio da qual recebem informações teóricas e fazem estágios práticos que possam causar um impacto positivo nos locais de atendimento.

 

O projeto não é focado em apresentações artísticas nesses locais, mas em uma relação de amizade em que o voluntário vai até o doente para conversar com ele, prestar seu apoio e solidariedade. “A base do trabalho é o diálogo animado, que parte de uma escuta interessada e a proposta de criação de um clima mais ameno dentro dos quartos e em quaisquer outros locais da instituição”, explica.

 

Na opinião de Mello, o principal desafio de trabalhar auxiliando doentes em hospitais, casas de saúde e outros espaços é compreender o papel do voluntariado, assim como usar a criatividade e a disciplina para construir bons encontros a cada visita.

 

“Sem dúvida alguma, a questão do contato com as dificuldades humanas é algo muito forte e interagir com pessoas em situação de pequenas ou grandes tragédias pode gerar nos voluntários um impacto difícil de gerenciar”, salienta. Por isso, o que se busca é passar a eles que as visitas não têm o poder de curar, mas podem trazer uma ajuda muito grande para quem recebe. Afinal, trata-se de algo material e, no caso dos voluntários, motivado pela vontade de ajudar quem não se conhece.

 

Luta contra dependência química é ato de amor

 

O Amor Exigente trabalha prestando apoio a dependentes químicos e familiares. A instituição tem 11 mil voluntários espalhados pelo Brasil, Argentina e Uruguai e foca o trabalho no atendimento via reuniões, cursos e palestras.

 

A professora Lusimar Alvares é voluntária há 12 anos e atua na região de Campinas, no interior de São Paulo. Ela acredita que o mais gratificante nessa caminhada é provocar mudanças positivas e ajudar a estabelecer limites justos e claros para melhorar as relações na família e na sociedade.

 

Nas reuniões semanais gratuitas, os voluntários trabalham 12 princípios e metas com os participantes, em grupos reduzidos e sob sigilo absoluto. “A cada semana as mudanças individuais são notadas. Pais, avós, cônjuges e amigos mudam seus comportamentos e aprendem a lidar com a dependência”, explica.

 

O mesmo acontece com os usuários, só que a abordagem com eles é feita em grupos separados, com orientações de outros voluntários. “Ao final, veem-se pessoas novas, esperançosas e com melhor qualidade de vida, enfrentando, sem medo, os desafios da vida”, completa.

 

Para Lusimar, o principal desafio de trabalhar com dependência química é que a doença carrega o estigma do mau-caratismo e, consequentemente, é revestida de preconceito – incluindo o que parte da família do dependente.

 

“Com relação às famílias, é fazer com que reconheçam a adicção como doença, para posteriormente tratá-la – e se reconheçam como co-dependentes, que precisam também analisar seus próprios comportamentos e atitudes em relação ao usuário”, explica.

 

O trabalho da Ong é direcionado justamente para que a família conheça e estude os problemas relacionados à droga, conseguindo assim ajudar o dependente, através do aconselhamento ao tratamento e também impondo limites e regras dentro de casa.

 

Fonte: Jornal Santuário de Aparecida