Quem não desempata acaba rebaixado


16 maio 2013

Mais difícil que realizar parece ser decidir. E a decisão é ainda mais desafiadora quando as coisas parecem estar nos conformes, ao menos aparentemente. Primeira expressão incômoda do texto: nos conformes. Sei o que ela quer dizer em seu sentido geral. Mas sendo só um pouquinho chato é possível observar outro significado: estar conformado. Ou ainda, estar dentro de uma forma ou fôrma. Se ainda fosse estar com o corpo em forma, ao menos a saúde física gritaria menos por socorro. Às vezes não tem nada de errado em estar nos conformes. Uma única medida determina se isso é interessante ou não para o sujeito da conformidade: sensação de coerência interna, ou ainda, bem estar subjetivo. Pelo menos na maior parte do tempo, ou tempo suficiente para acalmar a danada da angústia de existir. Outra forma de apresentar o conformismo da pessoa conformada é com expressão "empatada". No universo futebolístico, empatar quase nunca é bom. Quando o campeonato é de pontos corridos, o empate vale um ponto, enquanto a vitória vale três. A diferença entre a derrota e o empate, portanto, é bem pequena. Talvez seja um incentivo para que o time arrisque, jogue para vencer. Quando se trata de um duelo do tipo mata-mata e um dos times tem a vantagem do empate, às vezes uma equipe joga com o regulamento embaixo do braço, cozinhando o jogo para que ele termine o quanto antes e a vitória venha. No entanto, são inúmeros os casos em que o time medroso sofreu um revés e foi punido por ter apostado em uma estratégia, no mínimo, medíocre, para não dizer covarde e pouco desportiva. Futebol é espetáculo. Vida é mais ainda! Ficar empatado, arrastando o jogo, conformado com algo que não vai bem, atrofia o espírito vital dos jogadores. Que tal desempatar? Claro que tentar isso a qualquer custo pode resultar em desastre, especialmente quando feito de qualquer forma, com a displicência e o destrambelhamento querendo se passar por coragem. São coisas bem diferentes. Corajoso não é quem ignora o medo, mas, sim, quem reúne forças e atitudes para enfrentar a paralisia e ousar fazer diferente. O medo, parente meio patinho feio da cautela e da serenidade, é um dos responsáveis pela sobrevivência da espécie humana ao longo do tempo. Ele é parte do time, convidado importante dos diálogos que determinam as jogadas que serão feitas em busca da vitória. Assim, seres em busca do desempate respeitam o medo, mas não são submissos a ele. Tampouco são submissos aos gritos que vêm de fora do campo, com recomendações que, por mais que sejam bem intencionadas, podem estimular o atleta a jogar para a torcida, esquecendo-se daquilo que é importante para si mesmo. Quantas vezes já fizemos gols contra após ouvir os cantos das sereias que estão fora de nossas quatro linhas? As regras dos jogos individuais são responsabilidades de cada um. Claro que podemos ouvir quem quer que seja, especialmente quem parece se importar de verdade conosco. Mas quando o apito agudo dos juízes internos sufocam, o jogador precisa bater no peito e assumir a responsabilidade pela jogada. Até porque, quando a partida termina, a torcida vai embora e nós ficamos em nossos campos, digerindo o resultado das opções que fizemos, celebrando com fogos de artifício ou vendo os refletores se apagando e abrindo espaço para o silêncio devastador. Ainda como no futebol, quem empata sempre acaba sendo rebaixado. E não conheço rebaixamento mais triste que o consciente, que dia-a-dia corrói a vontade de vencer e de viver. Sempre é tempo de desempatar! E o desempate só acontece pela sucessão de jogadas ativas, esforçadas, entusiasmadas, corajosas. Virão as contusões, o cansaço, o desânimo, as críticas, o medo do ridículo. Mas que não morra a vontade de jogar mais bonito. Felizmente o nosso jogo não precisa terminar em 90 minutos. O campeonato é longo e o troféu está reservado a quem busca melhorar a cada rodada. Melhor que ser melhor que os outros é olhar para nós mesmos e descobrir o que ainda falta para desempatarmos. Que tal começar agora? Fortalecimento de músculos e alma, alongamento, respiração, emoções inteligentes, entusiasmo, muita água! E vamos ao campo! Quem realmente gosta do seu time te apoiará, mesmo quando você escolher jogadas menos conformadas e mais ousadas. O que seria do futebol sem o toque individual do craque? O que seria da vida sem a coragem de ser o que sou e posso vir a ser? Viva o espetáculo do desempate de nós mesmos!