“Quero plantar Amor”, diz a voluntária Márcia Silva


19 julho 2013

Estive no IOT-HC (Instituto de Traumatologia e Ortopedia do Hospital das Clinicas), hospital em que atuo como voluntária no projeto de amenização hospitalar da ONG Canto Cidadão, e após passar por um exame de retorno resolvi visitar alguns queridos amigos e vou contar o que senti a vocês.

 

Cadê meu nariz?? Depois de ter entrado por quase um ano neste Hospital, dessa vez senti a emoção de um primeiro dia. Tudo diferente, afinal hoje sou uma visita comum. Nome na portaria e etiqueta para entrar.

 

Enquanto aguardava o horário de visita, olhei atentamente o movimento de uma portaria. Os semblantes de quem entra e quem sai do hospital, aflições de quem está atrasado para uma consulta, a felicidade de quem esta retornando para casa, uma entrega, uma informação, os comentários de quem está ali a trabalho, a passagem dos profissionais por mim já bem conhecidos, os inúmeros “boa tarde” de todos os tipos. Enfim, tudo isso através da invisibilidade que meu nariz guardado na bolsa me permitiu…

 

E foi exatamente assim que me senti "Invisibilizada”. Afinal sempre que chego com aquela mala enorme e o crachá na mão, já arranco um belo sorriso. E depois de vestir minha arma secreta, MEU HIPER SUPER INCRÍVEL NARIZ, tudo se transforma, pois os olhares não conseguem ser indiferentes a todas aquelas cores.

 

Aproveitando minha falta de nariz, conversei com a recepcionista como alguém que ali estivesse realmente pela primeira vez.No meio da conversa a enfermeira contou a uma colega que “os Doutores da alegria” haviam passado por lá no dia anterior, nem pude defender afinal estava lá apenas como espectadora de passagem…

 

Continuando minha experiência de um novo olhar do meu já conhecido ambiente.. Profissionais passaram por mim sem me reconhecerem… Acompanhantes que sempre vejo com um ar mais leve, sem aquela válvula de escape do sorriso, agora encontro com um ar de tristeza por estar a espera de boas noticias.

 

Naquela espera fui tomada por uma grande emoção:Uma mãe que viu o filho bem e consciente passando pelo corredor para UTI, em meio ao cansaço e aflição de 9 horas de cirurgia, correu ao encontro dele dizendo: “só quero ver ele, por favor só quero ver ele ..”. Ao mesmo tempo o filho olhava a procura de alguém que estivesse ali na por perto, como espectadora vi atentamente aquela cena com riqueza de detalhes, e levando o rapaz pra dentro da sala o enfermeiro carinhosamente disse fique tranquila, a enfermeira já virá para falar com a Senhora.A mãe que até agora se segurava, ao se virar não conteve as lagrimas em meio aqueles profundos e sinceros agradecimentos a Deus. As colegas de espera compadecidas com o pranto perguntaram o por que do choro.

 

O desabafo da mãe disse o que eu já estava sentindo com ela : “Ele está perfeito e bem , as lágrimas são de Felicidade “.Aquela emoção de conforto que fez com que eu também chorasse me conduziu, como num filme, por meio dos meses que estive aqui. Foram tantos contratempos, falta de incentivo e superações… Que são facilmente apagados toda vez que vejo um sorriso. Essa cena fez com que eu percebesse que ainda tenho sensibilidade para me alegrar com a felicidade de qualquer pessoa a minha volta. A perceber que cada gesto por menor que seja faz diferença, que sim aquela minúscula máscara é a maior do mundo, e cabe um mundo dentro dela. Percebi que tantas e mais tantas emoções me esperam.

 

E fazem eu reconhecer que agora em agosto, aquela declaração que fiz há um ano, será renovada quantos anos for permitida: “QUE VENHA O NARIZ VERMELHO …QUERO SER UM DOUTOR CIDADÃO”. Porque Sou apaixonada por bons encontros. Acredito no poder do sorriso e na esperança mesmo em meio às dores, acredito que podemos ser renovados a cada dia. Que o amor com que fazemos e transmitimos nos sentimentos e gestos transformam o ambiente.

 

Sai de lá sem ter feito a minha visita, mas as pequenas impressões do pouco tempo que pude estar ali valeram muito, me fizeram ter reflexões, lembranças e motivação extra pra chegar em casa e procurar meu nariz. E assim, estar de volta à visita de quinta: "quinta categoria”.

 

Afinal Cada escolha, por menor que seja, é uma forma de semente que lançamos sobre o canteiro que somos. Um dia, tudo o que agora silenciosamente plantamos, ou deixamos plantar em nós será plantação que poderá ser vista de longe… Para cada dia, o seu empenho. A sabedoria bíblica nos confirma isso, quando nos diz que "debaixo do céu há um tempo para cada coisa!" Hoje, neste tempo que é seu, o futuro está sendo plantado. As escolhas que você procura, os amigos que você cultiva, as leituras que você faz, os valores que você abraça, os amores que você ama, tudo será determinante para a colheita futura.

 

Felicidade talvez seja isso: alegria de recolher da terra que somos, frutos que sejam agradáveis aos olhos! Infelicidade, talvez seja o contrário. O que não podemos perder de vista é que a vida não é real fora do cultivo. Sempre é tempo de lançar sementes… Sempre é tempo de recolher frutos. Tudo ao mesmo tempo. Sementes de ontem, frutos de hoje, Sementes de hoje, frutos de amanhã!

Quero plantar Amor! De nariz ou Não….